8.23.2010

Um movimento anti-psiquiátrico abalizado

É certo e sabido que em Portugal, assim que haja um crime mediático ou incêndios em abundância, os cidadãos, sem distinção de classe social, ocupam-se com afã de atacar a psiquiatria e a psicologia usando de argumentos tão válidos quanto medievais. Aliás, enquanto atacam a ciência, glorificam métodos inventados com alguma criatividade por Torquemada no recomendável século XV.

O engraçado e inovador neste movimento tão português e tão Verão, é que se o movimento de anti-psiquiatria original tinha como objectivo defender os cidadãos de práticas excessivas da ciência, o movimento anti-psiquiatria de Verão compele a sociedade a utilizar com severidade a ciência contra o ser humano. O movimento exorta a experiências utilizando o fogo, o chumbo, aço inoxidável ou cordas de ráfia em seres humanos, com a eventualidade quase sempre desejada da morte do experimentando.

Interessante como são postos em causa os diagnósticos recorrendo a silogismos aceites pela maioria da população. "Ai pegou fogo à mata? E dizem que é maluco? Só para vir cá para fora outra vez!" No fundo as pessoas não acreditam que alguém que pegue fogo a alguma coisa sem outro propósito que não seja o acto em si, não esteja no perfeito juízo. As pessoas também gostavam de pegar fogo às coisas e ficam lixadas quando alguém o faz e não os chama para ver o espectáculo. Os cenários dantescos são apelativos e as pessoas querem, já agora, acabar o servicinho e se temos mata a arder nada como colocar lá um ser humano dentro como forma de sacrifício e de agradecimento às divindades por tal espectáculo da natureza.

E há por vezes a ideia de que esta época é a delícia de qualquer cidadão histriónico. Os telejornais proporcionam às mais variadas senhoras a possibilidade do espectáculo de uma vida. O fogo avista-se e os berros irrompem com o fulgor de uma Valquíria.


Momento demagógico: não vejo o movimento tão activo quando se trata de baixas médicas por depressão.

8.20.2010

De volta às pessoas

Um trabalho onde por vezes a luta é não abanar a cabeça com desdém a quem tentámos ajudar. Onde a liberdade de cada um é soberana e a dignidade muito superior a qualquer preconceito ou julgamento moral. Mas podemos aprender com os erros dos outros on duty. E aí, apropriamo-nos de experiências das quais não teríamos conhecimento sem o trabalho escolhido aos irrisórios 17 anos. Quando voltar a ouvir uma pré-púbere exclamar de forma tão inconsciente quanto histriónica que quer estudar psicologia como forma de auto-ajuda, não me vou irritar tanto.

8.15.2010

A incompetência adora companhia

Sempre que exortamos um(a) incompetente a trabalhar e este está sozinho, com estupefacção reconhecemos o esgar de tristeza surpreendida acompanhado de suores frios com o olhar para o lado, procurando com afã alguém a quem recorrer. Mas quando o(a) incompetente está acompanhado(a) é o exortador que se desgraça. As desculpas, os compromissos, as questões da legalidade laboral, o superiores, os trâmites rotineiros, a exequibilidade, a aferição de necessidade do trabalho...Sabendo da dúbia moralidade de recusar trabalho que lhe é devido, só com as costas quentes a incompetência se atreve a vociferar. E quando o exortador tem a habilidade social de um abominável homem das neves, a incompetência consegue chegar aos tais superiores como responsabilidade e preocupação legítima. Que se foda.

8.12.2010

8.03.2010

Coisas que a vida traz

Com o tempo apercebemo-nos da falibilidade do ser humano, deixamos a criancice ingénua e olhamos à volta percebendo que, quem diria, há pessoas com características profundamente desagradáveis para nós. Alguns anos depois de o pueril mundo desabar, reconhecemos que apesar de a chusma estar ao nosso redor, também lhe pertencemos.Portanto somos portadores de características humanas igualmente desagradáveis para outras pessoas. Tendo esta noção, com mais ou menos esforço tendemos a moldar o nosso comportamento caso isso se justifique segundo todos os nossos valores pessoais, familiares, sociais... Há os que se moldam debalde, fazendo da manipulação afectiva ou social a única forma de relacionamento e sobrevivência em sociedade. Escondendo a sua essência, são clones mimetizando comportamentos, gostos, estilos e até afectos. Há os que nunca se moldam, assumindo a estúpida máxima "sou como sou, ninguém tem nada a ver com isso". Todos padecem da grave condição da certeza absoluta.